quarta-feira, 29 de setembro de 2010

"Um vasto Poema"

"Por su súbita emergencia y su vigor creador, Teotihuacán parece concebida en el deslumbramiento de esta revelación exaltante y, como en un vasto poema, cada uno de los elementos que la componen forma rigurosamente parte de un todo altamente inspirado" (Laurette Séjourné)


"Aún vivo con sus ojos cerrados y calientes,
tal vez sin que él lo note, el corazón le arrancan." (Carla Faesler)

A Calçada dos Mortos nos recebe como quem abraça antigos visitantes há muito esquecidos. Sua geometria astronômica e gris acalenta um passado de vigor e cor. Todos os apetrechos que a modernidade nos impõe tombam nesta caminhada, agora seremos apenas humanos. Sorvo a secura de seu ar. A vegetação que vemos nesta que era a rua principal de Teotihuacán, a Cidade dos Deuses, é rala, de um verde desbotado. Entrecortam a calmaria gritos dos vendedores de quinquilharias, murmúrios dos turistas. O guia Tona, de apresentação e inglês impecáveis, mostra-nos algo antes de nos deixar sozinhos desbravando o sítio arqueológico. O único som que vem do passado, com os lamúrios dos sacrificados para que o sol renascesse sempre, é o surpreendente silvo de pássaro que ecoa ao se bater palmas posicionado o corpo em determinado ponto da calçada.

Das escadarias que dão acesso ao topo da Pirâmide do Sol e a da Lua não vemos sangue escorrendo, como retratou Diego Rivera, nem as cores fortes que cintilavam na base enquanto os sacerdotes calcavam seus pés numa ziguezagueante subida. A maior cidade da América pré-colombiana é ruínas. Certificadas pela Unesco como Patrimônio da Humanidade, mas ruínas, pedras que escapulam dos degraus ― migalhas de construções, como a de Malinalco, templo dos bravos guerreiros águia, que vieram do vento ou das montanhas e que recolho com as mãos para uma lembrança ―, enquanto os arqueólogos tentam a todo custo reconstruí-las e preservá-las, pedaço a pedaço.

Nestas duas semanas imersa pela e para a Poesia, me pergunto diante dessa convivência com dezenas de pessoas que, em seus países de origem, escrevem e estão nessa roda ― mesmo que seja para virar copos, distribuir livros entre si, escrever, enfim, na calma ou no ―, a poesia é monumento sólido? Ela traz uma mensagem, latente e fervente, como os antigos moradores de Teotihuacán? Como faz a poesia para levar seu canto vibrátil de geração a gerações, se não é apenas onda mecânica que se alastra? Diz a tradição mexica que uma nova pirâmide deveria ser construída sobre a outra a cada ciclo de 50 anos, para mostrar que aumentava o poderio do grupo. No Templo Maior, resquício asteca no Zócalo, podemos ver hoje e até andar por entre estas diversas fases que apareceram sob as escavações realizadas na década de 1970. Há fases da pirâmide que nem mesmo algumas gerações antiquíssimas viram e que nós temos o privilégio de ver, ressaltam. Pois se nós, poetas do hoje, participamos dessa camada aparente de pedra que se sobrepuja às anteriores, delas fazemos nossa base, nos imbuímos de sua estrutura e a modificamos ― somos, então, essa tradição que se faz e refaz, servil, arrogante, livre, rimada, modesta ou mordaz.

Podemos não saber muito bem tudo o que há por detrás dessa vontade, essa herança que nos sobrevoa, mas ela está lá a ser reconhecida. Logo ali, na Casa de la Primera Imprenta de América, de 1536, os primórdios de nossas relações tipográficas. E a poesia está aí, nos lados, no topo da pirâmide, nas entranhas, pois ela é a própria vida em estado pulsante, repaginando-se, resignando-se. Linguagem-monumento a ser reconstruída e sedimentada, destruída, revelada, apurada. Eu subo devagar os degraus da Pirâmide do Sol, os degraus são largos, o joelho resiste ao impacto e imagino os moradores de sua época de esplendor subindo correndo, o coração, sem medo? A constituição física baixa e troncuda, a vida breve. E dali, o firmamento é outra vez acre e pedregoso, e ousa ser o ontem em pleno dia resplandecente, e eu teimo em ser o agora, de papo para o ar. Eu subo devagar os degraus da Pirâmide da Lua, este joelho dobrado rendendo honrarias ao infinito.

Nota do Editor
Leia também "Tempo vida poesia 1/5", "Tempo vida poesia 2/5 e "Tempo vida poesia 3/5".

IR

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

A TODOS OS "DANTAS" E "ANTI-DANTAS":

Este texto virulento do jovem Almada (que contava 23 anos) terá sido escrito entre Abril e Setembro de 1916, sendo, portanto, anterior à conferência de 1917, início oficial do movimento futurista em Portugal.

Saiu este folheto de 8 páginas impresso em papel de embrulho, ao preço de 100 reis, todo grafado em maiúsculas e utilizando aqui e além, para sublinhar a onomatopeia - PIM!-, uns ícones representando uma mão no gesto de apontar. Segundo se diz, terá esgotado nos primeiros dias, por obra do açambarcamento do próprio visado. Apesar disso, ou graças a isso, o escândalo rapidamente se propalou e a polémica causada teve uma grande intensidade. É que, no fundo, não é só a pessoa de Dantas que é atacada, mas toda uma geração de literatos, actores, escritores, jornalistas, etc, que ele personificava: "Uma geração que consente deixar-se representar por um Dantas é uma geração que nunca o foi". Através da ironia e do sarcasmo, utilizando uma linguagem iconoclasta e insultuosa, abusando de exclamações, repetições e enumerações, Almada zurze o academismo instalado e os valores tradicionais que pretendia abalar.

Em suma, trata-se de um ataque implacável ao edifício cultural e artístico vigente que impedia a entrada e frutificação das novas correntes estéticas em Portugal. É Almada a abrir caminho ao Futurismo e a si próprio.


MANIFESTO ANTI-DANTAS E POR EXTENSO

por José de Almada-Negreiros

POETA D'ORPHEU FUTURISTA e TUDO



BASTA PUM BASTA!

UMA GERAÇÃO, QUE CONSENTE DEIXAR-SE REPRESENTAR POR UM DANTAS É UMA GERAÇÃO QUE NUNCA O FOI! É UM COIO D'INDIGENTES, D'INDIGNOS E DE CEGOS! É UMA RÊSMA DE CHARLATÃES E DE VENDIDOS, E SÓ PODE PARIR ABAIXO DE ZERO!

ABAIXO A GERAÇÃO!

MORRA O DANTAS, MORRA! PIM!

UMA GERAÇÃO COM UM DANTAS A CAVALO É UM BURRO IMPOTENTE!

UMA GERAÇÃO COM UM DANTAS À PROA É UMA CANÔA UNI SECO!

O DANTAS É UM CIGANO!

O DANTAS É MEIO CIGANO!

O DANTAS SABERÁ GRAMMÁTICA, SABERÁ SYNTAXE, SABERÁ MEDICINA, SABERÁ FAZER CEIAS P'RA CARDEAIS SABERÁ TUDO MENOS ESCREVER QUE É A ÚNICA COISA QUE ELLLE FAZ!

O DANTAS PESCA TANTO DE POESIA QUE ATÉ FAZ SONETOS COM LIGAS DE DUQUEZAS!

O DANTAS É UM HABILIDOSO!

O DANTAS VESTE-SE MAL!

O DANTAS USA CEROULAS DE MALHA!

O DANTAS ESPECÚLA E INÓCULA OS CONCUBINOS!

O DANTAS É DANTAS!

O DANTAS É JÚLIO!

MORRA O DANTAS, MORRA! PIM!

O DANTAS FEZ UMA SORÔR MARIANNA QUE TANTO O PODIA SER COMO A SORÔR IGNEZ OU A IGNEZ DE CASTRO, OU A LEONOR TELLES, OU O MESTRE D'AVIZ, OU A DONA CONSTANÇA, OU A NAU CATHRINETA, OU A MARIA RAPAZ!

E O DANTAS TEVE CLÁQUE! E O DANTAS TEVE PALMAS! E O DANTAS AGRADECEU!

O DANTAS É UM CIGANÃO!

NÃO É PRECISO IR P'RÓ ROCIO P'RA SE SER UM PANTOMINEIRO, BASTA SER-SE PANTOMINEIRO!

NÃO É PRECISO DISFARÇAR-SE P'RA SE SER SALTEADOR, BASTA ESCREVER COMO DANTAS! BASTA NÃO TER ESCRÚPULOS NEM MORAES, NEM ARTÍSTICOS, NEM HUMANOS! BASTA ANDAR CO'AS MODAS, CO'AS POLÍTICAS E CO'AS OPINIÕES! BASTA USAR O TAL SORRISINHO, BASTA SER MUITO DELICADO E USAR CÔCO E OLHOS MEIGOS! BASTA SER JUDAS! BASTA SER DANTAS!

MORRA O DANTAS, MORRA! PIM!

O DANTAS NASCEU PARA PROVAR QUE, NEM TODOS OS QUE ESCREVEM SABEM ESCREVER!

O DANTAS É UM AUTOMATO QUE DEITA PR'A FÓRA O QUE A GENTE JÁ SABE QUE VAE SAHIR... MAS É PRECISO DEITAR DINHEIRO!

O DANTAS É UM SONETO D'ELLE-PRÓPRIO!

O DANTAS EM GÉNIO NUNCA CHEGA A PÓLVORA SECCA E EM TALENTO É PIM-PAM-PUM!

O DANTAS NÚ É HORROROSO!

O DANTAS CHEIRA MAL DA BOCA!

MORRA O DANTAS, MORRA! PIM!

O DANTAS É O ESCARNEO DA CONSCIÊNCIA!

SE O DANTAS É PORTUGUEZ EU QUERO SER HESPANHOL!

O DANTAS É A VERGONHA DA INTELLECTUALIDADE PORTUGUEZA! O DANTAS É A META DA DECADÊNCIA MENTAL!

E AINDA HÁ QUEM NÃO CÓRE QUANDO DIZ ADMIRAR O DANTAS!

E AINDA HÁ QUEM LHE ESTENDA A MÃO!

E QUEM LHE LAVE A ROUPA!

E QUEM TENHA DÓ DO DANTAS!

E AINDA HÁ QUEM DUVIDE DE QUE O DANTAS NÃO VALE NADA, E QUE NÃO SABE NADA, E QUE NEM É INTELLIGENTE NEM DECENTE, NEM ZERO!

VOCÊS NÃO SABEM QUEM É A SOROR MARIANNA DO DANTAS? EU VOU-LHES CONTAR:

A PRINCÍPIO, POR CARTAZES, ENTREVISTAS E OUTRAS PREPARAÇÕES COM AS QUAES NADA TEMOS QUE VÊR, PENSEI TRATAR-SE DE SORÔR MARIANNA ALCOFORADO A PSEUDO AUCTORA D'AQUELLAS CARTAS FRANCEZAS QUE DOIS ILLUSTRES SENHORES D'ESTA TERRA NÃO DESCANÇARAM ENQUANTO NÃO ESTRAGARAM P'RA PORTUGUEZ, QUANDO SUBIU O PANNO TAMBÉM NÃO FUI CAPAZ DE DISTINGUIR PORQUE ERA NOITE MUITO ESCURA E SÓ DEPOIS DE MEIO ACTO É QUE DESCOBRI QUE ERA DE MADRUGADA PORQUE O BISPO DE BEJA DISSE QUE TINHA ESTADO À ESPERA DO NASCER DO SOL!

A MARIANNA VEM DESCENDO UMA ESCADA ESTREITÍSSIMA MAS NÃO VEM SÓ. TRAZ TAMBÉM O CHAMILLY QUE EU NÃO CHEGUEI A VER, OUVINDO APENAS UMA VOZ MUITO CONHECIDA AQUI NA BRAZILEIRA DO CHIADO. POUCO DEPOIS O BISPO DE BEJA É QUE ME DISSE QUE ELLE TRAZIA CALÇÕES VERMELHOS. A MARIANNA E O CHAMILLY ESTÃO SÒZINHOS EM SCENA, E ÀS ESCURAS DANDO A ENTENDER PERFEITAMENTE QUE FIZERAM INDECÊNCIAS NO QUARTO. DEPOIS O CHAMILLY, COMPLETAMENTE SATISFEITO DESPEDE-SE E SALTA P'LA JANELLA COM GRANDE MAGUA DA FREIRA LACRIMOSA. E ANDA HOJE OS TURISTES TEEM OCCASIÃO DE OBSERVAR AS GRADES ARROMBADAS DA JANELLA DO QUINTO ANDAR DO CONVENTO DA CONCEIÇÃO DE BEJA NA RUA DO TOURO, POR ONDE SE DIZ QUE FUGIU O CÉLEBRE CAPITÃO DE CAVALOS EM PARIS E DENTISTA EM LISBOA.

A MARIANNA QUE É HISTÉRICA COMEÇA DE CHORAR DESATINADAMENTE NOS BRAÇOS DA SUA CONFDENTE E EXCELLENTE PAU DE CABELEIRA SORÔR IGNEZ.

VEEM DESCENDO P'LA DITA ESTREITÍSSIMA ESCALA (sic), VARIAS MARIANNAS TODAS EGUAES E DE CANDEIAS ACESAS, MENOS UMA QUE USA ÓCULOS E BENGALLA E AINDA (sic) TODA CURVADA P'RÁ FRENTE O QUE QUER DIZER QUE É ABBADESSA.

E SERIA ATÉ UMA EXCELENTE PERSONIFICAÇÃO DAS BRUXAS DE GOYA SE QUANDO FALLASSE NÃO TIVESSE AQUELLA VOZ TÃO FRESCA E MAVIOSA DA TIA FELICIDADE DA VIZINHA DO LADO, E REPARANDO NOS DOIS VULTOS INTERROGA ESPAÇADAMENTE COM CADÊNCIA, AUSTERIDADE E IMMENSA FALTA DE CORDA...

QUEM ESTÁ AHI?... E DE CANDEIAS APAGADAS?

- FOI O VENTO, DIZEM AS POBRES INNOCENTES VARADAS DE TERROR... E A ABADESSA QUE SÓ É VELHA NOS ÓCULOS, NA BENGALA E EM ANDAR CURVADA P'RÁ FRENTE MANDA TOCAR A SINETA QUE É UM DÓ D'ALMA O OUVI-LA ASSIM TÃO DEBILITADA, VÃO TODAS P'RÓ CÔRO, MAS EIS QUE, DE REPENTE BATEM NO PORTÃO E SEM SE ANNUNCIAR NEM LIMPAR-SE DA POEIRA, SOBE A ESCADA E ENTRA P'LO SALÃO UM BISPO DE BEJA QUE QUANDO ERA NOVO FEZ BRÉGEIRICES CO'A MENINA DO CHOCOLATE.

AGORA COMPLETAMENTE EMENDADO REVELA À ABBADESSA QUE SABE POR CARTAS QUE HÁ HOMENS QUE VÃO ÀS MULHERES DO CONVENTO E QUE AINDA HÁ POUCO VIRA UM DE CAVALLOS A SALTAR P'LA JANELLA. A ABADESSA DIZ QUE EFFECTIVAMENTE JÁ HÁ TEMPOS QUE VINHA DANDO P'LA FALTA DE GALLINHAS E TÃO INNOCENTINHA, COITADA, QUE N'AQUELLES OITENTA ANNOS AINDA NÃO TEVE TEMPO P'RA DESCOBRIR A RAZÃO DA HUMANIDADE ESTAR DIVIDIDA EM HOMENS E MULHERES.

DEPOIS DE SÉRIOS EMBARAÇOS DO BISPO É QUE ELLA DEU COM O ATREVIMENTO E MANDOU CHAMAR AS DUAS FREIRAS DE HÁ POUCO CO'AS CANDEIAS APAGADAS. N'ESTA ALTURA ESTA PEÇA POLICIAL TOMA UM PEDAÇO D'INTERESSE PORQUE O BISPO ORA PARECE UM POLÍCIA DE INVESTIGAÇÃO DISFARÇADO EM BISPO, ORA UM BISPO COM A FALTA DE DELICADEZA DE UM POLÍCIA D'INVESTIGAÇÃO, E TÃO PERSPICAZ QUE DESCOBRE EM MENOS DE MEIO MINUTO O QUE O PÚBLICO JÁ ESTÁ FARTO DE SABER - QUE A MARIANNA DORMIU CO'O NOEL. O PEOR É QUE A MARIANNA FOI À SERRA CO'AS INDISCREÇÕES DO BISPO E DESATA A BERRAR, A BERRAR COMO QUEM SE ESTAVA MARIMBANDO P'RA TUDO AQUILLO. ESTEVE MESMO MUITO PERTO DE

SE ESTRElAR COM UM PAR DE MURROS NA CORÔA DO BISPO NO QUE (SE) MOSTROU DE UM ATREVIMENTO, DE UMA INSOLÊNCIA E DE UMA DECISÃO REFILONA QUE EXCEDEU TODAS AS EXPECTATIVAS.

OUVE-SE UMA CORNETA A TOCAR UMA MARCHA DE CLARINS E MARIANNA SENTINDO NAS PATAS DOS CAVALLOS TODA A ALMA DO SEU PREFERIDO FOI QUAL PARDALITO ENGAIOLADO A CORRER ATÉ ÀS GRADES DA JANELLA A GRITAR DESALMADAMENTE P'LO SEU NOEL. GRITA, ASSOBIA E REDOPIA E PIA E RASGA-SE E MAGÓA-SE E CAE DE COSTAS COM UM ACCIDENTE, DO QUE JÁ PREVIAMENTE TINHA AVISADO O PÚBLICO E O PANNO TAMBÉM CAE E O ESPECTADOR TAMBÉM CAE DA PACIÊNCIA ABAIXO E DESATA N'UMA DESTAS PATEADAS TÃO ENORMES E TÃO MONUMENTAES QUE TODOS OS JORNAES DE LISBOA NO DIA SEGUINTE FORAM UNÂNIMES N'AQUELLE ÊXITO TEATRAL DO DANTAS.

A ÚNICA CONSOLAÇÃO QUE OS ESPECTADORES DECENTES TIVERAM FOI A CERTEZA DE QUE AQUILLO NÃO ERA A SORÔR ALCOFORADO MAS SIM UMA MERDARIANNA ALDANTASCUFURADO QUE TINHA CHELIQUES E EXAGEROS SEXUAES.

CONTINUE O SENHOR DANTAS A ESCREVER ASSIM QUE HÁ-DE GANHAR MUITO CO'O ALCUFURADO E HÁ-DE VER, QUE AINDA APANHA UMA ESTÁTUA DE PRATA POR UM OURIVES DO PORTO, E UMA EXPOSIÇÃO DAS MAQUETES P'RÓ SEU MONUMENTO ERECTO POR SUBSCRIÇAO NACIONAL DO SÉCULO A FAVOR DOS FERIDOS DA GUERRA, E A PRAÇA DE CAMÕES MUDADA EM PRAÇA DO DR. JULIO DANTAS, E COM FESTAS DA CIDADE P'LOS ANNIVERSÁRIOS, E SABONETES EM CONTA «JULIO DANTAS» E PASTAS DANTAS P'RÓS DENTES, E GRAXA DANTAS P'RÁS BOTAS, E NIVEINA DANTAS, E COMPRIMIDOS DANTAS E AUTOCLISMOS

DANTAS E DANTAS, DANTAS, DANTAS, DANTAS... E LIMONADAS DANTAS - MAGNESIA.

E FIQUE SABENDO O DANTAS QUE SE UM DIA HOUVER JUSTIÇA EM PORTUGAL TODO O MUNDO SABERÁ QUE O AUTOR DOS LUZÍADAS É O DANTAS QUE N'UM RASGO MEMORÁVEL DE MODÉSTIA SÓ CONSENTIU A GLÓRIA DO SEU PSEUDÓNIMO CAMÕES.

E FIQUE SABENDO O DANTAS QUE SE TODOS FÔSSEM COMO EU, HAVERIA TAES MUNIÇÕES DE MANGUITOS QUE LEVARIAM DOIS SÉCULOS A GASTAR.

MAS JUYGAES QUE N'ISTO SE RESUME A LITTERATURA PORTUGUEZA? NÃÓ! MIL VEZES NÃO!

TEMOS, ALÉM D'ISTO O CHIANCA QUE JÁ FEZ RIMAS P'RA ALUBARROTA QUE DEIXOU DE SER A DERROTA DOS CASTELHANOS P'RA SER A DERROTA DO CHIANCA.

E AS PINOQUICES DE VASCO MENDONÇA ALVES PASSADAS NO TEMPO DA AVÔSINHA! E AS INFELICIDADES DE RAMADA CURTO! E O TALENTO INSÓLITO DE URBANO RODRIGUES! E AS GAITADAS DO BRUN! E AS TRADUCÇÕES SÓ P'RA HOMEM (D) O ILLUSTRÍSSIMO EXCELENTÍSSIMO SENHOR MELLO BARRETO! E O FREI MATTA NUNES MÔXO! E A IGNEZ SYPHILITICA DO FAUSTINO! E AS IMBECILIDADES DO SOUSA COSTA! E MAIS PEDANTICES DO DANTAS! E ALBERTO SOUSA, O DANTAS DO DESENHO! E OS JORNALISTAS DO SECULO E DA CAPITAL E DO NOTICIAS E DO PAIZ E DO DIA E DA NAÇÃO E DA REPUBUCA E DA LUCTA E DE TODOS, TODOS OS JORNAES! E OS ACTORES DE TODOS OS THEATROS! E TODOS OS PINTORES DAS BELLAS ARTES E TODOS OS ARTISTAS DE PORTUGAL QUE EU NÃO GOSTO. E OS DA AGUIA DO PORTO E OS PALERMAS DE COIMBRA! E A ESTUPIDEZ DO OLDEMIRO CESAR E O DOUTOR JOSÉ DE FIGUEIREDO AMANTE DO MUSEU E AH OH OS SOUSA PINTO HU HI E OS BURROS DE CACILHAS E OS MENÚS DO ALFREDO GUISADO! E (O) RACHITICO ALBINO FORJAZ SAMPAIO, CRITICO DA LUCTA A QUEM O FIALHO COM IMMENSA PIADA INTRUJOU DE QUE TINHA TALENTO! E TODOS OS QUE SÃO POLITICOS E ARTISTAS! E AS EXPOSIÇÕES ANNUAES DAS BELLAS ARTE(S)! E TODAS AS MAQUETAS DO MARQUEZ DE POMBAL! E AS DE CAMÕES EM PARIS! E OS VAZ, OS ESTRELLA, OS LACERDA, OS LUCENA, OS ROSA, OS COSTA, OS ALMEIDA, OS CAMACHO, OS CUNHA, OS CARNEIRO, OS BARROS, OS SILVA, OS GOMES, OS VELHOS, OS IDIOTAS, OS ARRANJISTAS, OS IMPOTENTES, OS SCELERADOS, OS VENDIDOS, OS IMBECIS, OS PÁRIAS, OS ASCETAS, OS LOPES, OS PEIXOTOS, OS MOTTA, OS GODINHO, OS TEIXEIRA, OS DIABO QUE OS LEVE, OS CONSTANTINO, OS GRAVE, OS MANTUA, OS BAHIA, OS MENDONÇA, OS BRAZÃO, OS MATTOS, OS ALVES, OS ALBUQUERQUE, OS SOUSAS E TODOS OS DANTAS QUE HOUVER POR AHI!!!!!!

E AS CONVICÇÕES URGENTES DO HOMEM CHRISTO PAE E AS CONVICÇÕES CATITAS DO HOMEM CHRISTO FILHO!

E OS CONCERTOS DO BLANCH! E AS ESTATUAS AO LEME, AO EÇA E AO DESPERTAR E A TUDO! E TUDO O QUE SEJA ARTE EM PORTUGAL! E TUDO! TUDO POR CAUSA DO DANTAS!

MORRA O DANTAS, MORRA! PIM!

PORTUGAL QUE COM TODOS ESTES SENHORES, CONSEGUIU A CLASSIFICAÇÃO DO PAIZ MAIS ATRAZADO DA EUROPA E DE TODO OMUNDO! O PAIZ MAIS SELVAGEM DE TODAS AS ÁFRICAS! O EXILIO DOS DEGRADADOS E DOS INDIFERENTES! A AFRICA RECLUSA DOS EUROPEUS! O ENTULHO DAS DESVANTAGENS E DOS SOBEJOS! PORTUGAL INTEIRO HA-DE ABRIR OS OLHOS UM DIA - SE É QUE A SUA CEGUEIRA NÃO É INCURÁVEL E ENTÃO GRITARÁ COMMIGO, A MEU LADO, A NECESSIDADE QUE PORTUGAL TEM DE SER QUALQUER COISA DE ASSEIADO!

MORRA O DANTAS, MORRA! PIM!

José de Almada-Negreiros

POETA D'ORPHEU
FUTURISTA
e
TUDO

Por uma nova geração da escrita a nu,

IR - "Anti-Dantas"

Fernando Dacosta "Almada e Dantas a Nu", Público Magazine, 4/4/93 (adapt.)

ALMADA E DANTAS A NU


O "Manifesto Anti-Dantas e por Extenso", escrito por Almada em 1915, foi uma pedrada no charco da vida literária e social da época. Hoje, à distância de décadas, o choque entre ambos assume novos contornos e permite outras leituras.

O primeiro acto que chamou as atenções do público para José Almada Negreiros, um jovem em começo de carreira no ano de 1915, não foi de natureza cultural, mas social, não teve intenções criativas, mas destrutivas. Tratou-se do lançamento de um manifesto de várias páginas e vários insultos dirigido contra o, então, expoente máximo das letras portuguesas: Júlio Dantas.

Com irreverências nunca vistas, Almada achincalha-o (e ao que ele representa) gravemente, abrindo espaço para si e para a sua geração, a do "Orpheu", que Dantas apelidara de "paranóica".

Fulminado de espanto, por indignação uma parte, por regozijo outra, o país divide-se, radicaliza-se. Almada passa a ter nome. E pressa.

Decide jogar cada vez mais forte. Não tem a paciência, a intemporalidade de Pessoa. Quer o presente e quere-o sem medida, sem espera.

Sabe que a maneira mais fácil, mais rápida, de se ganhar evidência nos círculos culturais é utilizar a violência, o escândalo, o terrorismo contra os, neles, famosos.

Júlio Dantas - poeta, dramaturgo, cronista, jornalista, conferencista, médico, deputado, militar, ministro, glória das instituições, da política, da literatura, do teatro, da sociedade da época, académico de dezenas de academias, referência para o Prémio Nobel e para a Presidência da República - era-lhe uma tentação; até porque não iria reagir, não iria contra-atacar. As figuras proeminentes encontram-se, em situações dessas, muito expostas, quase indefesas.

"Morra o Dantas, morra! Pim! O Dantas é o escárneo da consciência! O Dantas é a vergonha da intelectualidade portugueza!

O Dantas é a meta da decadência mental! E ainda há quem não core quando diz admirar o Dantas! E ainda há quem lhe estenda a mão! E quem tenha dó do Dantas! Morra o Dantas! Morra! Pim!", grita Almada.

Dantas sofre a afronta em silêncio. "Não posso falar, eu próprio fiz coisas dessas na minha juventude", confidencia. E lembra, lembra-nos por ele Luís de Oliveira Guimarães, que para se vingar do crítico Fernandes Costa, general e académico, escreve o "Auto da Rainha Cláudia", em que o põe em intimidades no quarto com a amante, a escritora Cláudia de Campos.

Almada multiplica-se em provocações. Espera Dantas à porta de casa -residia na Rua Ivens (habitou em 22 prédios diferentes)- e, quando o vê, põe-se em sentido, faz-lhe um manguito e berra: "As armas, às áármas, às áááááármas!"

Feroz na amizade como na inimizade, Almada defende a murro (fizera-se razoável pugilista) Amadeo de Souza-Cardoso, quando um quadro seu é cuspido pelo público na abertura, em 1916, de uma exposição na Liga Naval. "É mais importante a descoberta da pintura de Amadeo do que a do caminho para a Índia, porque a Índia foi há quatro séculos", invectiva.

O ano seguinte excita Lisboa ao apresentar-se de fato-macaco no Teatro República (S. Luiz) a ler o "Ultimatum às Gerações Futuristas do Século XX"; a seguir actua como bailarino ao lado de Helena Castelo Melhor no bailado de Ruy Coelho "A Princesa dos Sapatos de Ferro".

Afronta convenções e tabus, pelo corpo, pelo vestuário, pela violência, pela bizarria, pela "chantagem" verbal. "Ergo-me pederasta apupado d'imbecis", entoa, "as mulheres portuguesas são a minha impotência!"

Desce o Chiado de cabeça rapada e pintada, à "skinhead". Faz-se fotografar nu por Vitoriano Braga em poses de discóbolo. Ginasta de mérito, introduz o futebol amador entre nós. Faz moda. É a moda.

Apercebendo-se dos riscos que corre, salvaguarda: "Eu não pertenço a nenhuma das gerações revolucionárias. Eu pertenço a uma geração construtiva".

A partir dos anos 20, conquistada a celebridade (e o temor), muda de comportamento. Vê-se solicitado pelo poder, pelas instituições, pela imprensa, pela igreja. É um sedutor. Jornalistas e jornais ("Século", "Século da Noite", "Diário de Notícias", "Diário de Lisboa", "Diário Popular") estão do seu lado, têm-no do seu lado.

Passa a ser tratado por "Mestre". E como mestre se posiciona. "Dava-se na alegria de fruir a dádiva. Apenas era rigoroso", anotará Natália Correia, "na escolha daqueles a quem se dava. Uma generosidade selectiva, timbre dos grandes espíritos."

Nascido em S. Tomé, Almada dizia-se, no entanto, natural de Lisboa. Amulatado e com apelido de Negreiros, costuma chamar, depreciativamente "pretos" e "ciganos" aos que queria ofender.

"Portugal é um pais de pretos", escrevia. "Dantas é um cigano, um ciganão. Escrevia: "Portugal, uma resultante de todas as raças do mundo, nunca conseguiu vantagem de um cruzamento útil porque as raças belas isolaram-se por completo". É preciso criar a adoração dos músculos", é preciso educar a mulher portugueza na sua verdadeira missão de fêmea para fazer homens". "Fazei a Apotheoze dos Vencedores, seja qual for o sentido, basta que sejam Vencedores. Ajudai a morrer os vencidos". "Portugal não tem ódios e uma raça sem ódios é uma raça desvirilizada".

Dantas ouve-o e entristece. Numa tarde de calor, à porta da Bertrand, está de conversa com Luís de Oliveira Guimarães. Almada desce a rua, pára na sua frente por instantes, tira o chapéu, inclina-se prossegue. Dantas segue-o com o olhar.

"Este Almada, sempre tão velho, coitado!", exclama.

Lidos hoje, os seus manifestos fazem sorrir. São de uma linearidade, de um agressividade enternecedoras. Tantos insultos acabam por voltar-se, pela sua obsessão de chocar, pelo seu delírio de excessos, mais contra quem os desfere do que contra quem os recebe.

Daí que Albino Forjaz Sampaio, perante a afirmação, no anti-Dantas, de que "Dantas nu é horroroso", haja perguntado num "suelto" da "Luta": "E o que é que nós temos a ver com as decepções sexuais do senhor Almada Negreiros?"

Dizer que Dantas, um dos nossos maiores autores, "nasceu para provar que nem todos os que escrevem sabem escrever não passa de pilhéria; dizer que ele "cheira mal da boca" e admirar-se por haver "quem lhe lave a roupa", isto de um homem que, na sua época, é um modelo da elegância, não colhe convencimento.

Dantas veste-se sempre com esmero ("uma pessoa que se sente bem arranjada tem mais confiança em si própria"), gravata, chapéu, água-de-colónia, anel de safira, e comporta-se sempre com afabilidade. "Saber sorrir é saber viver", enfatiza. "Na vida, como no jogo, o primeiro prazer é ganhar, o segundo é perder!".

A um autor desancado pela crítica, que o procura, responde: "Não responda. Não há nada que valha a dignidade do silêncio. Quanto mais você subir mais detestado, mais insultado será. Eduque o seu espírito na lição da serenidade, que tudo vence; da generosidade, que tudo perdoa".

Não é verdade, como se fez crer, que Almada e Dantas não se falassem. Embora a incomodidade se tivesse instalado entre um e outro, num, Almada, por irritação, noutro, Dantas, por mágoa (os ataques do primeiro magoaram-no mais do que ofenderam), cumprimentavam-se quando se viam, interessavam-se pelos trajectos de ambos e tinham amigos comuns.

Quando Salazar escolhe Júlio Dantas para a Exposição do Mundo Português, uma das primeiras pessoas que ele chama para trabalhar é Almada Negreiros. "A luta pela originalidade", dirá, "é uma corrida vertiginosa aos assuntos novos, às imagens novas. E, afinal, há uma maneira fácil de ser original: é ser sincero".

Júlio Dantas nasceu e faleceu no mês de Maio ("uma Primavera o trouxe, uma Primavera o levou", comenta Luís de Oliveira Guimarães). Maios separados por 86 anos de uma vida, de uma obra, de uma postura, de uma perspectiva singularíssimas.

"Entre outros talentos teve o prodígio da versatilidade política. Gostava de estar", evoca-nos António Valdemar, escritor e jornalista, "sempre perto do poder". Para se aproximar do Paço e da Rainha escreve a "Ceia dos Cardeais". Não recebendo os cargos e as honrarias a que julgava ter direito, aproveita-se da crise do regime monárquico e faz "Um Serão nas Laranjeiras", denúncia da decomposição da corte. Mas não se afasta dela.

Aguarda, por exemplo, a chegada da família real de Vila Viçosa, no fatídico dia 1 de Fevereiro de 1908 e oferece a D. Amélia um ramo de flores. O mesmo ramo de flores que ela arremessou, conta Aquilino Ribeiro, à cara do Buiça, quando apontava e disparava a carabina. Proclamada a República, Dantas adere-lhe e publica na "Capital", em folhetins, Cruz de Sangue", reunida depois em livro sob o título "Pátria Portuguesa", uma exaltação do povo e uma condenação da nobreza. Perante o conflito desencadeado com a Igreja pela Lei da Separação de Afonso Costa, redige a peça "A Santa Inquisição", em que condena violentamente o Santo Oficio. Com o advento do salazarismo, dá-nos "Frei António das Chagas" elogio de quem se sacrifica, se imola pela Pátria. O abalo provocado pelo MUNAF pelo MUD, que faz estremecer a posição de Salazar, leva-o a reformular a "Antígona' com que se estreou Mariana Rey Monteiro, uma crítica ao velho ditador através da personagem de Creonte.

Há quem, ironizando, goste de dizer que, se Dantas continuasse vivo, teríamos tido peças sobre o 25 de Abril, o PREC, Mário Soares, Cavaco Silva - a favor e contra.

Almada Negreiros mostrou-se mais transparente. Apoiou o salazarismo e o catolicismo, fez vitrais para a igreja e murais para o regime. Aceitou denegrir figuras da oposição (caso de Norton de Matos) e propagandear grupos do regime (caso da Legião Portuguesa).

Morreu crente, com funeral católico e pompa religiosa. Era amigo de Cerejeira, admirador de Salazar.

Quando este vai à antestreia do "Auto da Alma", no Teatro S. Carlos, com cenários seus e interpretação de Maria Lalande, ambos se precipitam, no final, para o então presidente do Conselho.

- Posso dar-lhe um beijinho?, pergunta a actriz.

Salazar, indiferente:

- Se isso lhe dá prazer...

Ela beija-o.

Almada avança:

- Posso cumprimentar Vossa Excelência?

Salazar fita-o:

- É o senhor Almada?

Almada curva-se respeitosamente:

- Sim, senhor Presidente, sou eu. Tenho muita, muita honra em cumprimentá-lo!

À distância, Vitorino Nemésio cicia para um amigo, que nos conta o episódio:

- O Dantas está vingado!

À pergunta sobre o que pensava de Deus, Dantas respondia sempre: "Como sabem, sou acima de tudo um homem de teatro. Ora Deus para mim é um elemento essencialmente cénico.

Dantas, a quem Augusto de Castro chamava o Quarto Cardeal, em alusão à "Ceia dos Cardeais", que eram três, e aos inúmeros bispos, frades, freiras, abades que povoam as sua obras ("são figuras eminentemente teatrais", repetia), recusa-se a casar religiosamente e exige que o seu funeral seja civil.

"Isso causou uma grande perturbação nos meios católicos, dado o seu prestígio", destaca-nos António Valdemar, presente no funeral. "Para salvar as aparências, Cerejeira pediu ao padre Moreira das Neves que se deslocasse à Academia das Ciências, onde o corpo estava em câmara ardente, e que permanecesse junto da urna, de joelhos, a rezar, sobretudo nas alturas em que a sala tivesse mais gente. Moreira da Neves assim fez".

Vitorino Nemésio, que sucedeu a Júlio Dantas na Academia, fez, ao ocupar-lhe o lugar (a cadeira número 13), a evocação oficial. Com talento, com desassombro, sublinha ("não me cansarei de o elogiar!") a sua alta qualidade literária e a sua invulgar mestria dramatúrgica - que lhe dão lugar cimeiro nas letras portuguesas.

Carlos Malheiro Dias vai mais longe:

"Ninguém como Dantas deu tanta plasticidade, tanta riqueza verbal, tanto ímpeto à nossa língua. Nem o Eça, nem o Fialho".

Hoje, 100 anos volvidos sobre o seu nascimento, Almada Negreiros é, como Júlio Dantas, uma instituição da nossa cultura. Ambos têm as contradições, os excessos, os sonhos, as jactâncias, as perversidades dos excepcionais. Noutras circunstâncias, noutra época, poderiam ter sido talvez cúmplices e assumido posições diferentes - inversas?

Eram demasiado grandes para ficarem alheios um ao outro. Mereceram-se um ao outro.»

IR - "anti-dantas", por uma nova geração da escrita.

sábado, 11 de setembro de 2010

Na infância do Mundo
Ainda dorme
A origem de todas as coisas,
O Tempo do início,
O Espaço sagrado da ausência
Presente do Pecado,
O virgem da nudez
Primeira,
O Paraíso do Ser e do Não-Ser,
Onde Deus ditou
O Bem e o Mal.

Isabel Rosete
(A propósito do “Caim”, de Saramago, 2009)